Por Fernando Amaral, vulgo Quodores
As vezes - quase
sempre, na verdade - o jogo no campo é a parte mais cacete do
futebol. Mais chata, para resumir a parlenda. E esta frase não é
minha, é do querido Demétrius Cruz, amigo doutro blogue que escrevo sobre futebol e comparsa na vida.
Digo isso porque o
futebol é aquele trem bem mais complexo, que nem tese de doutorado,
pós doutorado e o escambau a quatro pode definir. Sim, há idiotas
de todas as matizes querendo o óbvio, que é reduzir a brincadeira
ao que rola no campo, com simples frivolidade, como algo importante
dentre as cousas desimportantes. Se ofendi, perdão. Aos idiotas, o
meu perdão.
O ludopédio, a
brincadeira, o futebol é a tampa da mesa de ferro do boteco da
esquina. Ou do boteco na faculdade, no boteco da beira da praia, no
boteco de qualquer confim do mundo. É o campo de botão, seja o
Estrelão, a mesona oficial toda garbosa ou o chão. É a figurinha
do bafo. É o craque, o perna de pau, a dor da derrota, o gozo da
vitória, a torcida, o rádio, a pelota, a vizinha toda nua tomando
banho de sol na varanda. Ou o vizinho, dependendo sempre do que cabe
a cada um neste latifúndio de vontades e desejos – o único latufúndio
produtivo, aliás.
O futebol é tirar
onda, sarro, zoar, pentelhar o cara que torce pelo outro time. É
torcer contra time brasileiro só porque não quer ter aquele infeliz
lá do trabalho a lhe aporrinhar o saco. É mistério. É torcer
escondido pelo gol do craque. É dizer a maior besteira do mundo sem
culpa sobre quem foi, é e será melhor em campo, na história, na pelada da rua. É rabiscar nos
intervalos de aula, durante o almoço, antes de dormir, esquemas
táticos e escalar equipes maravilhosas. É chamar o treinador de
renomado imbecil mesmo sabendo que nunca gostaria de estar no lugar
do cara. É comprar ingresso para apupar jogador e depois pedir
autógrafo para este mesmo infeliz. É a terra da hipocrisia
permitida, porque brincadeira.
Mas brincadeira
séria, se é que existe brincadeira que não é séria. Não venham
dizer de arena multiuso, ar condicionado, cadeira com pantufa ou
qualquer dessas imundícies. Já proibiram a cerveja, a bandeira –
bom, aqui em SP, a terra onde não há amor, bandeira é proibida - e o
sanduba de mortadela. Até o pernil na porta do estádio andam
regulando, tratando de proibir o que a vigilância sanitária poderia
regular. Imbecis, completos.
Escrevo estas
linhas, que para muitos podem ser míopes de coração, para iniciar
os trabalhos aqui neste blogue de futebol. Futebol como o trem, não
como aquele joguinho de onze contra onze numa arena repleta de
perfume de alfazema com narração do Galvão Bueno. Escrevo para
afirmar que não há nada mais divertido, nada mais terrível, doído,
alegre, nauseabundo, entorpecente do que o trem. Nem beijo na boca de
quem se quer muito e se tinha dúvida da reciprocidade. Quem já fez
gol no último minuto de uma peleja sabe do gozo. E quem já perdeu
nos acréscimos sabe, mas sabe mesmo, sabe em todas as letras,
hipóteses e hipotenusas o que é a morte, em pessoa.
Nos periódicos
sobre o meu time ontem, e time todos sabemos essencial ao trem,
porque sem time se pode até conhecer mas nunca experimentar o
bagulho, as notas são fidedignas ao que foi o espetáculo: um jogo
fraquinho, muidinho, bobinho, mas com os dois times com alguma raça
e Luís Fabiano no lugar que um centroavante deve estar.
Porém, sempre
há um porém, as notas também dizem do público ridículo, de dez
mil testemunhas numa tarde de sol na cidadela piratininga. Ah...
fundamentais notórios especialistas caga regras e outros que tais...
da milonga vocês não entendem nada. Entre as testemunhas, estávamos
lá este escriba e a prole. E a paixão está nascendo aí, nesses
detalhes, nessas linhas, nessa bobagem. O jogo? Foi ruinzinho. Mas o
“Pai, tiraram o Piris, finalmente. Entrou o Rodrigo Caio”, com
ênfase no “finalmente”, foi do balacobaco.
E, por fim,
Fernandinho, meu querido, correr faz bem para a saúde, sem dúvida.
Mas futebol, futebol é outra cousa.
28 de maio de 2012. Segunda rodada do Brasileirão de 12.
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